terça-feira, 9 de agosto de 2016

Ah! Quem me dera...

Dias atrás eu fui a um sítio de uma amiga comemorar o aniversário de 06 anos da filha dela.  Claro que toda família estava por lá, e como sempre acontece, o meu lado magnético positivo para idosos logo me fez simpatizar com o avô da tal amiga.

O pai do meu pai já era falecido antes mesmo de eu nascer. O pai da minha mãe... bom, esse está entre nós, mas devido a uma série de questões, se a convivência for uma vez ao ano, em um almoço de natal, já é alguma coisa.

Eu não tenho e nem tive avô. Aliás, taí uma coisa que não deveria faltar a ninguém. A nenhuma criança e a nenhum adulto! Vô e Vó, pai e mãe, tinham quer ser eternos! É pedir muito? Tive avós, mas se foram, uma quando eu devia ter uns 9, 10 anos, e a outra quando eu tinha em torno de 20.

Avós são pessoas recheadas de ternura, afeto e carinho. Quando ninguém mais aguenta ou sabe o que fazer, como super heróis, eles tem uma solução. Eles transbordam paciência e exalam amor por todos os poros.

Seu Alberto.
Esse era o nome do avô da minha amiga.

Com sua bengala, cabelo branco nas laterais da cabeça e a careca no centro, me ganha fácil a simpatia. Cheio de histórias para contar, é uma lembrança viva do passado. Sabedoria personificada. 

Assim era ele, e assim, costumam ser todas as pessoas velhas. Assim costumam ser todos os avós. 

Assim sou eu querendo ouvir o que eles tem a dizer e o que aprenderam pela vida inteira.

Eu já havia topado com o sr. Alberto diversas outras vezes, em outros aniversários por aí, e cada vez que o via, sempre me encantava.

Não foi diferente dessa vez.  Ao me ver tocando violão, tomando um pouco de sol sentada à beira da piscina, de longe me gritou:

“- Ei! Vem tocar pra mim. Quero ouvir. Sente aqui ao meu lado”

Lá fui eu, recolhendo as cifras espalhadas, juntando tudo rapidamente e pensando com meus botões, se teria habilidade para tocar alguma música para ele.

Sorrindo cheguei ao lado dele, logo me explicando:

- Senhor Alberto, ainda não sei direito, estava justamente praticando porque fazem apenas uns oito meses que faço aula.

- Não importa minha filha. Então faz o seguinte, treina aqui do meu lado.

Assim fiz, e enquanto Sr. Alberto jogava dominó, eu praticava uma música que o professor havia me passado na última aula. Não demorou muito, ele me falou:

- Sabe, eu gostaria de ouvir uma música romântica. Dessas que eu gosto! Gosto muito de Roberto Carlos.

- Vou ver o que consigo fazer por você!

“Como vai você? Eu preciso saber da sua vida! Peça a alguém pra me contar sobre seu dia, anoiteceu e e preciso só saber: como vai você!”

Aos trancos e barrancos, com pausas maiores do que a música pede, com dedos em cordas erradas e em casas trocadas, uma melodia parecida começa a soar.

Seu Alberto fecha os olhos.

“- Você toca suave!”
- Mas tá mais ou menos Seu Alberto! Não sei direito, é muito difícil pra mim ainda.
- Sim sim, eu imagino. Mas continue!

“Como vai você, que já modificou a minha vida! Razão da minha paz, já esquecida... nem sei se gosto mais de mim ou de você!

A música acaba, e vou praticando outras coisas, até receber um novo pedido.

- Tem uma que gosto muito! Beijinho Doce!
- Essa é fácil!!

Que beijinho doce, que ela  tem! Depois que beijei ela, nunca mais amei ninguém.

- Você sabe que essa música é tudo mentira, né menina?
- hahahahahaha!!! Ta meio forçada né Seu Alberto?
-Mas é tão linda!!

Que beijinho doce, foi ela quem trouxe de longe pra mim. Se me abraça apertado suspiro dobrado, que amor sem fim!

- Vou te falar uma que você tem que aprender: Luar do Sertão
- Deixa eu pesquisar aqui..... Ahhh seu Alberto. Essa fica pra próxima, não sei nem como começa!
-Então essa você tem que aprender mesmo!
- Combinado.

E lá fiquei tocando outras velharias românticas que pensei que lhe agradariam.
Após um tempo, acabou a bateria do meu celular, então já não poderia mais acessar as cifras pelo aplicativo.

- Chega seu Alberto! Agora não sei mais nada, e os dedos já doem mesmo.
- Então vamos ali, tá vendo aquele pé de laranja lá na frente? A gente pega as laranjas e pode fazer um doce.

Ele me fala a receita passo a passo, até chegar alguém que o solicita e o leva para outro canto da festa.
Mais tarde chega o cara de novo:

- Agora quero jogar dominó com você!
-Opa! Vamos!!

Nisso,  Guilherme, um neto dele de 05 anos aparece sentando-se na mesa querendo jogar também.

Seu  Alberto me olha com uma cara do tipo, “putz! Já era!”. Mas continuamos jogando, e ele deixa o netinho ganhar, perdoando quando o moleque joga na nossa vez, e até quando ele coloca um quatro num canto que deveria ser cinco e me olha novamente “faz de conta que não vimos!” e eu pisco assumindo cumplicidade na vitória do pequeno Gui!

Na hora de ir embora, fui me despedir, e ele disse:

- Volta! Você vai voltar, não vai, outras vezes?
- Volto sim! Claro! E com a música que você me pediu aprendida... !